Indago aos céus sobre o porquê de tal pergunta ainda iluminar tantos diálogos. O que de tão interessante poderia haver nos dias alheios para sucitar tamanha dúvida? Ou, sendo um tanto mais cínico, por que fingir interesse por algo assim insignificante? O dia é tão pouco, o dia é tão banal - quisesse saber de mim e daquilo que verdadeiramente importa perguntasse como estou, não estou certo? Saberia, se tivesse perguntado logo de cara:
- Como você está? - levantaria a questão em tom pensativo.
- Certo, eu estou certo - arrebataria sem hesitar... embora houvesse certa dúvida.
Ora, veja você que só as pessoas incovenientes é que respondem a pergunta de modo sincero. Um amigo diz ao outro apenas "estou bem" mesmo que não esteja. Reconhece-se de chofre a frieza e formalidade da pergunta, não vai ser ela que resolverá, deixando os problemas para serem tecidos e destecidos no diálogo, na palavra, no verdadeiro contato... e sim, sou pessimista a ponto de crer que problemas sempre existirão.
E se o "como está?" não resolve, neste ponto eu até poderia concordar com a maior presteza e satisfatoriedade do "como foi seu dia?" que levanta alguma intimidade e anima o diálogo... só faltando descobrir o porquê exatamente.
Perguntar do dia não deveria resolver, é mera fração da semana, do mês, do ano; um quadrado da folha do calendário, uma folha da agenda... é parte do todo que se perdida não diria nada sozinha. Dentro da lógica mais hermética da coisa, de ir fracionando o tempo de modo mais racional e palpável, mais interessante capturar a hora, o minuto, o segundo... la moram momentos, sentimentos: as pontualidades do ser sensível.
Só que nem tudo é tão simples...
Perguntar do mês, ano ou semana te dá aquele ar de ausente desejoso de recuperar recapitulando o que foi perdido; perguntar do minuto, hora ou segundo, por outro lado, é sinal de obsessão e sim, um bom querer em demasia pode até funcionar em alguns momentos, mas não é ideal. Já o dia, ah, o dia! Este pode ser perfeito!
O dia pode lhes ser bom, meus amigos, acreditem! Bom porque pode não dizer tudo, aliás diz pouco, pode ser até tímido em meio a rotina e tantos dias parecidos, mas diz tudo o que é preciso. É banal, provavelmente será, reconheço.. tal qual a vida.
Vejam bem, não sei até que ponto isto lhe ocorre, mas o tempo oprime. Sinto-me fatiado entre passado e futuro, o que foi e o que será, restando uma mísera fração do que, de fato, é. O que seria o presente? O que nos é dado (tal qual o trocadilho sugere)?
Ao que eu responderia: o dia, o dia é nosso! Do despertar ao evanescer, do genesis ao dilúvio, fins e recomeços denotativos de existências completas. Não à toa, ao se determinar certas escolhas pensando a vida sob uma ótica otimista, proferir-se-á, muito provavelmente, a famosa frase carpe diem - aproveite o dia.
E por mais ingente, como diria Borges, que seja a forma de nosso ser comportando o todo - uma quimera do que fomos, somos e seremos - é vital capturar o momento em que o primeiro e o teceiro se tornam tributários do segundo, em que nossos planos e memórias não interfiram tanto e só deem o mapa para uma aventura vivida no presente.
Quem pergunta do seu dia, no final das contas, quer saber de você. O contrário também é válido: à quem contamos nosso dia, mesmo sem o interesse por saber manifesto por parte do outro, este nos importa, este nos provoca a confiança para a entrega do íntimo em seu mais alto grau de sinceridade, de transparência, de pureza!
Hoje, por acaso, é meu aniversário - vinte e um anos, caso queira saber. Dizem que é um dia importante, um dia acreditei, mas hoje (justo hoje!) tenho cá minhas dúvidas. De qualquer forma, não deixa de ser algo significativo, ficando a questão de a quem entregar bem de tamanho valor (provavelmente em relato fugido tal qual esta reflexão fútil).
Sei bem e tão bem sabe ela. E que se prepare, pois ostentarei este ritual de entrega pela palavra, o tesouro do escritor, por tantos dias quanto o amor que sinto se traduzir em vestígios no cotidiano. Difícil saber se realmente dou meu dias à ela, pode muito bem ser empréstimo ou devolução do que foi construído por nós. Pois que meu dia é tomado de lembranças e planos de dias ou, melhor dizendo, de uma vida que agora divido com ela.
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PS: Obrigado pelo presente, tanto pelo livro quanto pelo recado. Saber da falta que faço me permite sanar as inseguranças que se esgueiram, não sei como, por detrás de um sentimento que é perfeitamente seguro; saber da falta que faço me dá o espaço para lhe enviar, em sentimento e palavra, o dia de meu aniversário. Que lhe baste e te complete, como hoje me completou a sua falta.
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