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30 de julho de 2012

O Homem que Devorou a Montanha (parte 1)

Era uma vez em um tempo não muito distante, um senhor já de idade avançada que cuidava de ovelhas. Era bem velhinho, ou ao menos parecia, pois possuía uma barba bem branquinha tão fofa quanto a lã de suas ovelhas e até mais branca do que elas, já que viviam se sujando de lama pelos cantos. A barba de Nestor era muito bem cuidada, um motivo de orgulho, se diria... como se compensasse a vaidade ali pela total falta de cabelos. Sua careca, redonda e brilhante e quase tão afamada quanto a sua barba, era capaz de guiar visitantes a quilômetros de distância da pequena ilha que habitava, um farol particular! Ou ao menos era o que lhe diziam, Nestor tinha certeza de que era brincadeira de seus amigos, mas mesmo assim detestava cada vez que tinha de ouvir novamente essa história. E quantas vezes isso acontecia! Já perdera a conta... ouvia sempre calado e emburrado a enrolar um longo fio de sua barba, coisa que fazia quando estava nervoso ou preocupado.

De qualquer forma, Nestor já não se preocupava mais tanto com essas coisas, pelo menos não no momento em que nos ocupa essa história. Eram águas passadas, já fazia muito tempo desde que qualquer um o visitasse, fosse para caçoar de sua careca, elogiar sua barba, brincar com suas ovelhas ou qualquer outra coisa. Eram só ele, suas ovelhas, a pequena cabana e a montanha nas cercanias de sua propriedade. Não possuindo vizinhos, ou os desconhecendo completamente, não usava de cercas pra marcar até onde iam suas terras e caminhava com suas ovelhas onde quer que mandasse a sua vontade... ou a sua fome. Subir, descer, ir, voltar, tudo uma questão de onde estariam os frutos mais frescos ou o maior divertimento como o de procurar a parte mais agitada do rio que descia a montanha pra brincar de hidromassagem sentado nas pedras com a água batendo nas costas enquanto chupava a manga mais doce do pé.

A vida seguia calma, calma demais, entediante inclusive. Até que em uma noite muito parada em que nada poderia acontecer tudo mudou, a começar por uma ideia: por que não comer a montanha? - foi o que Nestor pensou pensou e pensou e foi isso mesmo o que ele fez, comeu uma montanha inteira.

- Como ele fez isso, papai? - os olhos da pequena brilhavam pela primeira vez durante toda a história e Geraldo, que estava sentado junto de sua cama, se apercebeu do fato de que de todas as reações possíveis de sua filha, o seu interesse genuíno (ou encantamento) era o que mais lhe atormentava. Tinha de fazer direito, não podia estragar tudo agora.

- Ora, com garfo e faca, de que outro jeito mais seria? - a resposta mais simples ou mais cínica, ainda que protegida pelo tom doce do pai amável que ensinava algo a sua filha, parecia a mais adequada.

- Não, vocês está mentindo! - protestou Liz buscando testar o seu pai, na verdade acreditava nele mas queria saber mais sobre como o homem comeu uma montanha inteira. Que ele explicasse melhor!

- Liz Liz! Acha que eu mentiria para você? Juro que é verdade! Veja, seus talheres são menores do que os do papai e da mamãe, certo? - assim explicou o pai medindo distâncias com as duas mãos - pois então, assim como seu prato e sua comida também são diferentes em tamanho e quantidade. Para comer mais, tanto quanto eu, você teria de usar o meu garfo ou o da sua mãe e para comer muuuuito mais - agora esticava os braços para ilustrar - sim, querida, certíssimo! Muito tipo uma montanha, só é preciso talheres especiais.

A pequena detetive pareceu satisfeita com o resultado do interrogatório. Antes de braços cruzados impaciente, bracinhos por fora das cobertas, agora puxava o edredom estampado de princesas para perto do queixo apreensiva. Queria que a história continuasse e sinalizou  com o olhar para seu pai que não demorou muito para entender o sinal.

- Vamos lá, aonde que eu estava mesmo? Ah sim...

Nestor, usando de seus talheres [pausa] mágicos comeu uma montanha inteira! Comeu tudo em apenas uma noite o que lhe deu uma tremenda caga... dor de barriga! Mas, mesmo assim, Nestor estava feliz, foi divertido e se sentia especial pois não ouvira falar de ninguém que tivesse feito aquilo antes. Talvez até duvidassem se ele contasse, mesmo seus amigos, os mais próximos, familiares, pessoas que ele confia duvidariam dele, o questionariam! Perguntariam como ele fez e achariam impossível... mesmo que nunca tivessem tentado.

- Incrível como as pessoas são, não é? Não acreditar nele mesmo...
- Tá, papai, entendi já. Continua!
- Certo, continuando..

A verdade, por mais triste que fosse, era que, assim como não tinha mais o problema de que o caçoassem por sua careca brilhosa, também não haveria quem duvidasse de sua história, pois, como sabemos, havia muito tempo que ninguém o visitava, nem para dar um olá, comer alguns docinhos, conversar, fazer perguntas ou qualquer outra coisa. Pensar nisso o deixou bem triste, triste de verdade e de repente a história toda com a montanha parecia bobagem e assim ficou por dias, entre as idas apressadas ao banheiro pela dor de barriga e o friozinho no peito pela saudade. Até que um dia um barulho de navio que chegava a costa e atracava no cais o distraiu de toda essa melancolia.

- Que tipo de navio, papai? Um navio pirata?! - Liz quase saltava da cama, entusiasmo contido por um longo bocejo. A menina lutava pra manter os olhos abertos os esfregando com suas mãozinhas.

- Sim... um navio pirata! - Geraldo estava com "navio mercante" na ponta da língua, o que na sua opinião seria a aposta mais segura para garantir verossimilhança histórica evitando anacronismos sendo uma solução suficientemente vaga abarcando, se me permite o trocadilho, um grande número de eras e tipos de embarcações, mas pesou por um segundo e, sem grande dificuldade, sentiu que valia esse pequeno ajuste para cativar o coração de sua pequena filha. Ossos do ofício, por seu trabalho aprendeu que o cliente tem sempre razão. E assim continuou a história...

Jerry [pausa] o pirata chegava a terra firme depois de uma longa jornada de aventuras mal sabendo há quanto tempo não tomava um bom banho de cachoeira ou comia algo fresco e saboroso. O que pouca gente sabe é que, por mais tesouros que saqueasse em suas aventuras essa riqueza toda não se traduzia em conforto na vida em alto-mar. Entendamos assim: não se podia comer ouro, só aquelas terríveis bolachas que, depois de meses guardadas, eram duras que só e sem gosto ou os ensopados misteriosos (esses cheios de "sabores") preparados por Iago que era ótimo em disparar canhões, mas uma negação na cozinha... o que talvez explicasse o porque da sensação de ter engolido uma bola de canhão depois tomar o ensopado.

Ainda assim, nem preciso dizer que a vida de pirada tem de suas recompensas. Em tantas aventuras era comum que conhecesse certos segredos, lugares secretos que valiam mais do que qualquer tesouro. E Jerry lambia os beiços só de pensar nas muitas frutas que nasciam escondidas pela montanha próxima a cabana de seu velho amigo, Nestor. Isso sem falar nas termas, verdadeiras banheiras quentes da natureza. Com esse pensamento, Jerry deixou a tripulação ocupada em cuidar de algumas coisas no navio e foi até Nestor pedir algumas maçãs para seu pessoal. Porém, para sua decepção...

- Eu comi.
- Ok, não tem problema, se não tem frutas aí eu subo lá e busco eu mesmo, a macieira não fica muito longe.
- Não, você não entendeu, eu comi a montanha.
- Todinha?
- Tudo tudo.

Então, inicialmente triste, depois satisfeito por entender o porquê de não ter avistado a montanha em alto-mar (a ausência do marco de navegação que lhe custou umas boas horas para achar o cais) foi ficando cada vez mais vermelho encarando o imenso descampado por trás da cabana onde anteriormente estaria a montanha. Enfurecido, Jerry olhou para Nestor e disparou meia-duzia de palavras feias de pirata que o velhinho tentava imaginar onde ele havia aprendido e voltou bufando para o seu barco.

A pequena aventureira ressonava serenamente o que explicava a falta de interrupções nos últimos minutos. Geraldo se divertia com o pensamento de que Liz agora se aventurava em sonho atrás dos tesouros escondidos dos piratas enquanto estavam distraídos com Nestor e a montanha devorada.

- Bons sonhos, princesa - beijo-a na testa e apagou o abajur. Continuaria a história outro dia.

[continua...]

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