Conheço muito bem, converso com ele todos os dias. Faço faculdade de história, não de previsão do futuro, por favor me poupem da perspectiva de história cíclica, masss... talvez por ter em grande parte o tempo como objeto de estudo, acabo levando isso um pouco para minhas reflexões mais íntimas e menos acadêmicas.
O que significa tudo isso, afinal? Nada, acontece que por algum motivo eu faço um constante diálogo com meus eu's passados e futuros tentando imaginar o que cada um diria ao outro, seja pelos vícios do ofício da graduação ou por vícios ordinários do pensamento distrativo que vai à lugares estranhos sem meu consentimento.
Conheço o futuro porque ele não existe, sou muito bom com esse "será" que nunca "é" que só não é um "seria" por falta de uma condicional mágica que tornaria tudo possível, que meu ceticismo não permite. Tenho muito disso, muitas previsões certas e imagens de sonhos mais definidas que memórias nubladas de um passado distante.
Sou bom com o que não existe, por que é nele que eu crio. Minha especialidade, como tenho cismado nas últimas postagens, é preencher o vazio... ou apenas dar um nome à ele. Não gosto de concertar o que existe e está quebrado, chamo de relíquia e não toco, uso da função de historiador para ser passivo diante de tudo.
Para certas coisas, posso ser bem inteligente. O racionalismo que eu emprego, as ligações que me vêm, as armadilhas que eu monto, é tudo muito elaborado para tornar a preguiça aceitável ou, até mesmo, única alternativa possível.
Um inteligência criadora, dissimuladora, tratante, burocrata... pera aí! É, burocrata, pode ser! Inunda o quadro de atividades da mente, sempre uma papelada a ser preenchida. Afinal, todas essas racionalizações da preguiça são bastante frágeis, só me ganham por estarem sempre em grande número. Tanto que sou um péssimo mentiroso.
Quando eu converso com alguém, não posso expor tudo da maneira como eu penso, ainda mais quando a conversa não é por escrito (msn e afins). Engano-me com maestria, mas minhas mentirinhas tem pernas curtíssimas! Que injustiça...
Mas e o futuro?
Está lá, olhando para mim, me perguntando se é isso mesmo. Meu eu de trinta anos, abarrotado de provas para corrigir e abençoando o fim de semana com umas cervejinhas, não se conforma com minha capacidade de reclamar. E eu, por minha vez, não me conformo com o comodismo desse eu trabalhador que tem preguiça de pensar nos problemas.
Mais perturbador que esse eu trabalhador era o eu de familia que contava a história de como conheceu a esposa para seus filhos, como achou que morreria se não a tivesse quando a viu pela primeira vez. Esse não se conformava com a minha ausência em relacionamentos amorosos que, aliás... perdura até hoje! Felizmente me livrei desse cara.
Mas a imagem que mais me agrada, e é uma vitória dizer isso acabando com o romantismo clichê e a ânsia super classe-média de trabalhar cedo para ter casa própria e aposentadoria, e me cobra, por consequência, é a do intelectual.
O que eu chamei de inteligência criadora (que, convenhamos, poderia muito bem ser chamada apenas de criatividade) me permite fazer coisas bem interessantes. Se são coisas com algum valor é outra história, o que produzo desperta a surpresa inicial, ao menos. O problema é que... eu sou absurdamente narcisista, não posso receber elogios.
[e me deprimo sem eles, bem verdade]
Então, imaginem: escrevo um texto satisfatório no blog e meu eu futuro favorito me agradece em uma noite de autógrafos do meu livro com um cavanhaque ridículo (só para dar o contraste com minha inaptidão de crescer uma barba cheia atualmente).
E assim vai. Um dez na faculdade já tornou possível, por exemplo, que eu me sentisse capaz de tentar um concurso de ensaios que costuma ganhar professor universitário! Aí, Futuro! Qual é a a sua?! Só me dá canseira...
Claro que... um pessimista genuino teria de ter uma perspectiva sombria de si. E eu tenho, eu tenho. Meu eu futuro mais terrível é o eu de agora. Doidera, não é? Meu pior temor é não mudar, escrever a mesma coisa daqui a dez anos.
E não só assim ele me assombra. Importante que se lembre que o presente já foi futuro do passado. E, nessa brincadeira, me imagino em meus dez anos espiando o que me tornei agora, fantasia que realmente tive. Ora, seria um assombro tremendo!
Ainda mais, por que em meus dez anos (e agora lhes permito espiar minha mente de criança) eu tinha a estranha impressão de que as coisas só poderiam piorar, em razão de uma extrema felicidade e tranquilidade que a vida assumira, naquele ponto. Veria o que sou agora como a confirmação daquele medo irracional e não sairia mais da cama.
Não que eu seja tão terrível, mas posso ser bem esquisito às vezes, demorou para que eu me acostumasse com aquilo que sou. O próprio rumo que tomou esse texto já é denotativo disto, não sei bem o que virá à seguir, mas eu vou escrevendo...
Isso até que acabem as ideias, que é o caso agora. Só falta uma mensagem de conclusão. Imediatamente me vem a "Familia do Futuro" (que figura junto de UP como provas de que a produção de animações de qualidade ainda vive) e o lema keep moving forward, que seria algo como "continue seguindo em frente".
Mas não combina muito comigo, não é?
- por outro lado, terminar do nada com uma pergunta... -
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