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1 de outubro de 2012

Letra Morta

Há um grande silêncio em minha alma que em nada identifica-se com a paz de espírito; se me calo, não consinto, apenas ignoro, finjo desconhecer o idioma de demandas da alma que antes me eram tão caras - deixo passar. Meus sentimentos e dores se vão sem que com isso me inunde a anestesia. Não há barulho ou ruído que reverbere em atitude ou protesto, nada se move na profundidade de meu ser, como se eu tivesse subitamente imergido ou acordado de longo sono, atento apenas ao que habita a superfície.

Hoje, comandado pela disciplina (ou disciplinado pelo medo), não dou mais que algumas braçadas no mar da vida sem colocar a cabeça pra fora para me aperceber do grande nada que me rodeia. Osmose ou difusão - perco-me ao tentar lembrar das aulas do colégio - o pouco que ainda havia em mim, eu, concentrado de sonhos, diluiu-se pelo universo adulto tão pobre de fantasia. Larguei as ideias, ou elas me escaparam (tanto faz), para abraçar ideais, tornei-me político com anseios cada vez mais pragmáticos.

A neurose competitiva do establishment e, consecutivamente, o inevitável desejo de entorpecer a ansiedade dela advinda, são impulsos que ao passar do tempo tornam-se tão familiares quanto legítimos. Outro dia tentei escrever uma carta de amor, amassei e a descartei terminando por redigir uma mensagem suicida em seu lugar... que também tornei a amassar e jogar fora; são sentimentos fora do lugar agora. Nada do que escrevo se adéqua ao que sou e projeto ser... ou ainda, ao mundo em que meu ser se projeta. A realidade de ambições maduras não comporta os amores platônicos que patinam patinam sem nunca sair do lugar. Instilado de desejos de sobriedade adulta que não toleram o desperdício e encarnando a juventude impaciente que só entra em jogo se for para vencer, chego a duros juízos sobre sentimentos não valerem a pena, amores inválidos... são letra morta, floreio.

Se é assim, por que prossigo?

Até tentaria, em meio a tantos desperdícios, direcionar-me a escrever sobre o verdadeiro Norte, a ambição digna. Mas nada do que escrevo parece servir mais do que ao propósito do alívio, meus pensamentos e, ouso dizer, sentimentos tornaram-se fisiológicos, o que tornaria até anti-higiênico guardar estes verdadeiros excrementos de meus processos psíquicos que ainda ouso expor ou, fugindo da escatologia, seriam tais pensamentos grafados um desperdício de espaço no acúmulo, por apego ou demência, que faço da escória da fundição de meu ego. Talvez seja um pouco mais do que isso, confesso.

O regojizo com a retórica é parcial, o que se vê pela minha completa falta de fé de que qualquer um (a quem eu dirigir ou endereçar minha palavra, como em uma conversa ou uma carta de amor) queira ouvir o que tenho a dizer, mas existe. Considero-me inteligente, sensível, do contrário pretensão alguma de isolamento perduraria: é preciso ter qualquer propriedade sobre si mesmo e sobre o mundo pra trancar as portas certas, mesmo que, no fundo, tal confiança seja subproduto de uma arrogância burra. Trocando em miúdos: considero-me inteligente, apesar e até por tudo, o que não me torna necessariamente inteligente (aqui supondo existirem critérios universais, ou consensuais, para avaliar-me), mas suficientemente confiante para decretar um suposto fim do mais afetivo e instável de meu temperamento apaixonado em prol da soberania de meu ser politico e racional. Graduado na engenharia da alma, fecho portas e abro janelas.

Quis mudar por ser insignificante, ou por tanto a mudança se manifestou. Pessoas inteligentes e sensíveis podem se tornar absolutamente prescindíveis, pequenos, ridículos diante da vida. Meu grau de excepcionalidade nem chega ao considerável, sou apenas "incomum", mas em um mundo de possibilidades tão rasas, não creio que eu pudesse ser muito mais do que isso. Diante do pessimismo e da agonia, o ser pragmático tem mais chance de sobreviver do que o romântico, é o que sou forçado a concluir em meio ao tanto que pensei em me morrer por esses dias. Modificar-me ou perecer, eis a questão mais uma vez. Para suportar as mágoas, recentes e antigas, visito o plano dos sentimentos com imenso cinismo e trago tudo à superfície, chamo de desejo, de tesão... de sinapse indesejável (ou loucura). E crescem as olheiras, pois o sono sem sonhos não regenera a alma.

O romântico que eu era, até semana passada quando tentei escrever a carta de amor e iniciei o esboço deste texto, se despedaçou depois de tantas cartas não-enviadas, desilusões e, é claro, Tédio. Hoje, enxergo o amor em letra minúscula, é apenas mais uma forma de anestesia, comparável ao cigarro e ao café. Esforço pra curar o tédio e me distrair da dor nas costas (e no ego). É lícito e, a princípio, inofensivo, funciona quando ministrado em doses regulares cada vez menos parcimoniosas, vicia e, mais importante: ainda vai me matar.

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PS: Objetivei afastar, com tanto racionalismo, o (des)amor e, consigo, os pensamentos de morte. Porém, a grande ironia deste relato, agora divido com vocês, é que a prova de que o romantismo subsiste é ainda acreditar que é possível morrer de amor. Sempre o mesmo.

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