Música

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27 de junho de 2013

Minha Melhor História

- dedicado a Iara, espero que te faça se sentir um pouco melhor.

Nunca fui muito bom na escrita, certos recursos da linguagem fora da alçada da gramática me confundiam. Desde que aprendi a ler e escrever aos seis anos, tenho essa sensação de ser um estrangeiro em meu próprio idioma, me atrapalhando com o que poderia ser considerado banal e óbvio pela maioria das pessoas. Digo isso tudo para ensejar um pedido de desculpas pelo relato a seguir, pois estou muito aquém dos grandes contadores de histórias com suas metáforas e metonímias, contento-me portanto em apenas contar os fatos conforme eles aconteceram. Espero que baste já que os fatos sucedidos, tão atípicos, por si só, já são suficientemente capazes (eu espero) de entreter o caro leitor.

Aconteceu há alguns anos quando eu ainda me aventurava em encontros às cegas. Lembro-me de que à princípio os temia por sempre me imaginar vendado em uma mesa de um restaurante boca de estrada na frente de um caminhoneiro barbudão, por pirraça de amigos. Descobri, mais tarde, que só era "às cegas" até que se chegasse ao local do encontro, sendo então um combinado às cegas... e às vezes nem isso! Já que geralmente mostravam uma foto pra mim (ligeiramente enganosa, mas clara) de quem eu deveria encontrar afim de que eu a aprovasse e, eventualmente, a reconhecesse ao encontrá-la.

Pois bem.

Lá estava eu em um encontro às cegas arranjado por colegas da faculdade. O "lá", no caso, era uma cantina italiana de muito bom gosto escolhida por mim. Não por tentar impressionar a menina, fosse por mim eu ficava em casa lendo os artigos para escrever minha monografia, tarefa que à época me tomava muitas noites solitárias. Aparentemente, isso era considerado deprimente por meus "colegas", o que acabou por se mostrar proveitoso, pois os motivou a apelar: apresentaram-me uma das garotas mais bonitas que eu já houvera visto (em foto). Recusar a proposta ia levantar mais perguntas e mais condescendência do que simplesmente aceitar o convite e ver no que dava, ademais... eu estava com vontade de comida italiana de boa qualidade e era (e ainda sou) péssimo cozinha.

Então, lá estava eu a espera dela. O "lá" vocês entenderam, só faltando o "ela" pra explicar... que é, aliás, o motivo de querer contar essa história pra vocês. Esperei uns poucos minutos em minha solidão pacífica e tão criticada por meus colegas até que ela chegasse. Era tão bonita quanto na foto, senão mais, mas de alguma forma diferente, difícil de pensar e ainda mais de descrever a um terceiro, como no caso aqui, você, leitor.

Seu nome era muito bonito, extravagante e delicado, assim como ela ao me pedir licença ao sentar e me cumprimentar, um nome que eu sabia associara a ela para sempre, afinal ela teve que me mostrar um cartão ilustrado que tirou do bolso de sua jaqueta que trajava por cima do leve vestido - e essa é uma cena difícil de se esquecer. Seu nome era impronunciável, era uma pintura, literalmente. Ela sorriu, eu sorri de volta sem esconder meu estranhamento e minha simpatia que crescia cada vez mais no decorrer da conversa. 

Um papo muito legal, mesmo.

Falamos de muitas coisas, todas as coisas, as minhas e as dela. Em meio ao silêncio eventual entre os assuntos, ela tirou um dicionário, parou em uma página qualquer e apontou uma palavra - a conversa seguiu. Sentia-me tranquilo nas conversas, pois naquele exercício vi que podíamos realmente falar sobre tudo. À princípio tranquilo, mas depois intimidado ao pensar que talvez não tivesse como acompanhá-la, pois inteligente e espirituosa, não cessava de crescer em minha admiração. Percebi-me cada vez mais fundo na cadeira, encolhendo, apequenando-me diante dela. Foi assustador, tentei me segurar e fiquei lá, pequenino, no espaço que me parecia imenso entre a ponta da toalha de mesa que eu segurava e o assento da cadeira. Ela carinhosamente me pegou em suas mãos e me colocou em seu ombro.

Durante o resto do jantar, desfrutei daquela sensação ao mesmo tempo assustadora e agradável, eu ali tão pequeno e frágil e, para minha alegria, próximo dela. Por um tempo, só conseguia olhar para a curvinha de seu pescoço e curtir o aroma de seu perfume que de lá despontava - do ângulo que estava, não podia muito mais e nem tinha pressa. Aos poucos, na demora que era percorrer toda a sua pele com meus pequenos olhos, apercebi-me de outros detalhes como seus olhos discretamente castanhos, os rebeldes cabelos vermelhos soltando-se de seu coque em torno das orelhas e seu brilhante e belo sorriso. Quando sorria, era possível ver todo o ambiente se iluminar, as velas nas mesas, os lustres, as lamparinas nas paredes ganhavam uma cor mais forte e vívida. À princípio suspeitei de curto-circuito, oscilação de energia e etc, o que ainda não explicava as velas.

Não foram poucas as vezes em que pensei que estivesse louco, pois nada daquilo era normal e, mesmo assim, ninguém além de mim parecia notar. Continuei lá ao lado dela, de qualquer forma, disposto a ser maravilhado pelo resto da noite. Intranquilo que estava, deixei-a desconfortável, pude ver e, quando começava a suspirar de angústia temendo afastá-la com meus receios de decepcioná-la, ela me envolveu com seus lábios, me abraçou com um beijo, tão pequeno eu estava. Aquela boca macia e doce levou todos os maus pensamentos embora me cobrindo em sua doçura. Voltei a minha postura e minha estatura, pagamos a conta e saímos do restaurante.

Era uma noite bonita e estrelada de inverno, uma raridade em nossa cidade de céu esfumaçado, o que nos fez decidir empregar uma caminhada até a casa dela que não ficava assim tão longe. Demoramos coisa de uma ou duas horas até sua porta, não saberia dizer, meu relógio parou assim que a vi pela primeira vez. Andávamos bem próximos um do outro conversando pela cidade vazia, não me apercebi de ninguém no trajeto e, pensando bem, não me lembro de outras pessoas além de nós dois e o garçom que nos serviu na cantina, momentos antes. Havia algo de especial nela, com certeza, não era tarde o suficiente pra justificar tamanha ausência nas ruas ou no restaurante, tenho quase certeza era sexta-feira a noite. Sem falar em meu relógio parado, era um bom relógio.

Chegando lá, ela me convidou para tomar um café eu aceitei, pois adoro café e não queria ir embora, não conseguiria. Ardilosa que era, em algum momento da noite, havia atado um nó em meu pulso com um fio de linha bem forte que ela usava pra me puxar para perto de si toda vez que eu tomava mais de dois pés de distância de seu corpo, não dava pra ficar longe. Dentro de sua casa, ela desatou o nó e me pediu que aguardasse sentado no sofá que ela me prepararia o café. Quando retornou, depositou a xícara na mesa de centro, pulou em meu colo e me deu um beijo que me deixou tonto. Foi incrível, fantástico e ao me afastar e recobrar os sentidos percebi que ouvia fogos de artifício, fato que se repetiu durante toda noite em todos os muitos beijos que demos. Fogos de todas as cores, estalinhos, estouros - parecia final de campeonato, o que era estranho, pois tenho quase certeza era sexta-feira... talvez fosse quinta ou quarta, dias mais comuns de jogos, vá saber.

Não me lembro de ter tomado café naquela noite ou de sequer ter encostado na xícara, pois tão logo chegamos, já estávamos no quarto dela bagunçando os lençóis e jogando as roupas para o alto. Eu podia sentir o calor de sua pele aumentar conforme nos abraçávamos sem o intermédio de nossas vestimentas  e bagunçava seus cabelos cor vermelho-paixão, assim os chamei pois quando os tomei em minhas mãos perto de sua nuca percebi que estava profundamente apaixonado. Bom, o que aconteceu a seguir, em meio a abraços cada vez mais apertados e beijos intensos, o leitor pode imaginar. Nossas peles arderam de desejo naquela noite e enegrecemos levemente os lençóis com a chama branda que aparecia em torno de nossos corpos. Por vezes hesitei com medo de me queimar, mas não muito, era gostoso e valia qualquer risco, um segundo depois já estava em seus lábios ouvindo fogos de artifício. 

Eita torcida animada era aquela!

A manhã seguinte foi um pouco embaraçosa, tive a impressão de que ela não me queria ali quando acordei e lhe sorri, mas ela desviou o olhar mirando a janela do quarto. Caía uma chuvinha fina e ela me pareceu melancólica e pequenina, encolhida dentro de si. Como na noite anterior, quando eu houvera encolhido, tratei eu de confortá-la, de envolvê-la em meus braços e enchê-la de cobertores, pois parecia muito fria, bem diferente da criatura em brasa que me ajudara a chamuscar a roupa de cama. Ela disse que estava doente e eu me ofereci pra passar o café ou fazer um chá e perguntei se havia algo que eu poderia fazer - ela não respondeu. Ficamos ali abraçados por algum tempo, adormecemos por um instante, ela acordou inquieta, parecia ter tido um pesadelo e disse que era melhor eu ir embora. 

Assenti com a cabeça.

Antes de colher as roupas pelo chão do quarto e ir embora, dei-lhe um último beijo, sem saber que seria o último - sem fogos dessa vez, apenas uma dor lancinante no peito que me fez ter de sentar por um minuto. Olhei para ela atônito e percebi que era isso o que ela sentia. Não sei se por orgulho ou por sentir que eu não poderia curar seu mal estar sem me contagiar, mas ela sem dúvida me queria fora dali. Achei por bem conceder esse desejo, afinal não era e nem sou médico, não a conhecia o suficiente e não sabia como ajudá-la, talvez me afastar fosse de alguma forma benigno. Na verdade, eu tive medo de não saber como agir, não sabia das coisas, era muito jovem. Fui embora.

De volta às ruas, abrigado no ponto de ônibus vi que meu relógio voltara a funcionar e eu duvidava se em algum momento tivesse parado de funcionar - duvidei de muitas coisas daquela noite, ao longo dos anos. Contei tudo depois aos meus colegas casamenteiros que propiciaram meu encontro, mas me tomavam por poeta, lirista, enquanto eu jurava que as coisas aconteceram tal qual eu as relatava, que era uma garota fantástica e coisas fantásticas aconteceram enquanto eu estive com ela. Acusaram-me de estar apaixonado e eu assumi prontamente, mas ainda assim achava absolutamente lógico e sensato que qualquer um que tivesse a oportunidade de conhecê-la iria se maravilhar tanto quanto eu. Não sei se meus colegas me levaram a sério, apenas me olharam meio abobados, sorriram e se beijaram suavemente. Não havia mencionado que eram um casal de amigos? Não sou muito bom em contar histórias, havia alertado.

Infelizmente, não tornei a vê-la e fiquei sem saber se era porque era uma pessoa solitária, se não gostou de mim o suficiente pra abrir mão da solidão ou mesmo se eu houvera a magoado por tê-la deixado quando mais precisava. Em minha cabeça, refiz muitas vezes as minhas atitudes sem que eu tivesse saído de seu lado, naquela manhã ou no resto de nossas vidas. Um tempo atrás, meus amigos me segredaram qual era o problema, parece que ela sofria de uma condição muito rara: possuía um coração grande, mal cabia no peito, um problema de formação que resultava em dores agudas e periódicas. 

Não podia ajudá-la, mesmo se tentasse, logo vi. Mas também percebi que, de uma forma muito egoísta, eu não mudaria um detalhe sequer dela, pois tudo a fazia maravilhosa, até mesmo seu coração grande e dolorido. Foi difícil depois tocar a vida onde os relógios nunca param e os beijos não explodem em cores no ar e me envolvem todo o corpo. Seja como for, tenho muito mais a agradecer do que lamentar. Sempre que conto essa história as pessoas parecem ficar felizes, o que é, por si só, outra coisa fantástica sendo que nunca fui muito bom contador de histórias. Falando sobre ela, exatamente como era, eu, um orador tão chato e matemático, me torno lirista, poeta. Por isso, obrigado. E onde quer que esteja, espero que tenha encontrado a cura para uma vida sem tantas dores com um coração enorme.

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